quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

A voz dissonante de um general

É curioso reler o que se escreveu na imprensa nacional aquando da entrada em circulação do euro, em 1 de Janeiro de 2002. Regra geral, o tom foi de celebração e euforia com “este simples e prodigioso testemunho (…) legado por uma geração ímpar de homens convictos e corajosos” (Público, 02-01-02), “O triunfo da visão estratégica e da vontade política” (Público, 06-01-02), o “símbolo de um acesso ao desenvolvimento duramente conquistado” (DN, 06-01-02), “uma ideia que funciona” (Público, 05-01-02).
Verdade que havia a noção de que nem tudo eram rosas. O Diário de Notícias falava da “frivolidade guterrista” (05-01-02), que teria a obrigação de “saber tirar partido dessa mais-valia” e se não soubesse estaria a “falsear os cidadãos”. O Público admite que “ o euro não é um passo de mágica que desfizesse nomeadamente as desigualdades sociais” (06-01-02). Aqui e acolá, vislumbram-se mesmo algumas sombras. O euro poderia ser uma “droga” para “um doente em estado terminal de bulimia financeira” (Público, 07-01-02), os portugueses poderiam ver “ a sua vida continuar a andar para trás” (DN, 02-01-02). Curiosamente, as falhas, a existirem, seriam sempre da responsabilidade de instâncias governativas internas, que poderiam não ter arte nem engenho para saber aproveitar esta oportunidade histórica. E, claro, sobre o defunto escudo, nem uma palavrinha de tristeza ou saudade.
No meio desta “euroforia”, o militar Carlos Azeredo foi uma das poucas vozes dissonantes. Segundo o general, em causa estava “ a extinção da nossa moeda nacional abrir o caminho para a dissolução da nossa pequena mas antiga realidade como nação independente na vastidão de uma unidade (?) europeia, na qual os mais poderosos vão fatal e inexoravelmente impor os seus interesses.” (Diário de Notícias,11-02-02). O euro colocaria fatalmente a Alemanha como o (perigoso) centro do poder, “aquilo que Hitler não conseguiu com a mauser, vai finalmente ser consumado pelo marco ‘travestido’ em euro.”
De acordo com o general, não se tratava apenas de um problema de perda de soberania e de “esmagamento” do país face aos países maiores. Havia também um problema de ilegitimidade da decisão, um processo de “assassínio” por parte de um “conjunto de políticos e economistas que tomaram esta decisão sem qualquer arrepio e bem nas costas do povo português”.
Na altura, a opinião do general passou despercebida no meio do ruído dos festejos e celebrações; quando muito, era apenas mais um “velho do Restelo”. Hoje, parece-me interessante verificar que o general estava mais perto da verdade do que a carrada de políticos, economistas, gestores, comentadores e jornalistas que embarcou nesta aventura sem uma hesitação, sem um “arrepio”.

1 comentário:

  1. É uma falsa questão. Também o Escudo estava absolutamente dependente da Grande Finança. A solução é colocar o Euro sob a batuta dos cidadãos europeus – fazendo um bypass aos banqueiros e aos governantes a soldo destes…

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