terça-feira, 17 de setembro de 2013

A oitava e a nona

A OITAVA E A NONA AVALIAÇÕES,
ou
A OITAVA E A NONA SINFONIA BURRICAL,
ou será
A OITAVA E NONA SINFONIAS BURRICAIS?



De tantas vezes ler e, sobretudo ouvir, à guisa de matraca assassina, a expressão que me serve de título a este escrito, senti-me esta tarde de tal arte agoniado, que as torneiras do vómito se desenroscaram sem que me restasse outra opção (não cheguei a tempo de pôr as mãos nos gorgomilos) que não fosse a de lançar a carga enjoativa ao mar da carpete da sala onde leio, escrevo, ouço música, deixo cair os olhos fatigados no mar do Canal para os desfadigar e, nos interregnos, ainda ouço os noticiários televisivos nauseantes, repisados até à quintessência do Português mascavado… Alguns dos nossos locutores e jornalistas precisavam de uma quarta classe bem tirada, seguida de um exame rigoroso, com ditado e redacção, e só se passassem com boas médias a Língua Materna poderiam ser admitidos a um estágio intensivo antes de desempenharem o seu mester de informar os ouvintes e os leitores. Nem por isso deixou a Ilha de São Jorge, à minha frente, de continuar ornamentada de azul-cobalto, estriado de roxo, de verde tenro, laivado de cinzento-claro, e de outros matizes interpostos e infindos, numa mescla alucinada e alucinante de co¬res que pincel algum de pintor famoso seria capaz de capturar… Se ela os ouvisse, tingia-se de luto fechado e cobria-se de nevoeiro à espera que Dom Sebastião chegasse de Alcácer-Quibir…

Aqui, na Ilha do Pico, o tempo é de vindimas, com a crise em pano de fundo menos remoto do que se esperava. Aí, no Continente, a es­tação dos incêndios deixou há instantes de cumprir com lealdade a função para que fora destinada, matando oito bombeiros, asfixiando e desertificando boa parte deste País. Acaba de declarar por sua honra que vai cair em letargia durante algum tempo, a fim de ressus­citar com mais vigor para de novo subir ao palco da tragédia. En­quanto está hibernando, chegou a tróica para tecer outro tempo – o da Oitava e Nona Avaliações… Porquê avaliações e não avaliação? A oitava avaliação; a nona avaliação = a oitava e a nona avaliação! Se­gunda e Terça-feira, ou Segunda e Terça feiras? Primeira e Se­gunda Classe, ou Primeira e Segunda Classes? Primeiro e Segundo Sargento, ou Primeiro e Segundo Sargentos? Primeira e Segunda Trompa, ou Primeira e Segunda Trompas? Quem nos tira a plurali­dade tira-nos tudo… Até o Presidente da República, que é um barra na Língua e História Pátria, ou Língua e História Pátrias? (não nos esqueçamos do famigerado nunca fiz, não faço, nem façarei, nem da dúzia de cantos dos Lusíadas…), ele, vede bem, disse esta manhã a oitava e a nona avaliação… Paulo Portas afirma e infirma, conforme a hora, o lugar, ou a parte do dia em que é escutado. Hoje de manhã disse certo: Oitava e Nona Avali­ação; à tarde foi mesmo irrevogável: Oitava e Nona Avaliações! Afinal, tudo isto não passa de uma ques­tão de opiniães ou de avaliaçães, ou de cidadões, como disse há tempo quem sabe da poda e da política portuguesa ou portuguesas? Ao fim da tarde telefonei para a SIC-Notícias. Atendeu-me uma jo­vem deli­cada, a voz macia e segura. Disse-lhe ao que vinha. Respon­deu-me que ia passar a chamada a quem de direito. Passou. Identifi­quei-me, disse da minha justiça e pedi ao senhor de direito que transmi­tisse o meu reparo a quem tivesse poder de reunir os jorna­listas da estação e lhes dissesse como deviam dizer a expressão ou lhes desfi­zesse o erro… Que sim, mas não concordava comigo. Trata-se de duas ava­liações diferentes, daí estar certo dizer-se Oitava e Nona Avalia­ções… Perguntei-lhe se também dizia que ia ao giná­sio à Quinta e Sexta-feiras. Não, respondeu-me. E eu: não são, como as avaliações troicanas, dias da semana diferentes? Calou-se… E as­sim vamos trincando, truncando e troicando a Língua e a Gramá­tica Portuguesa e os miolos de muita gente pensadora e pensionista! Ou não será a Lín­gua e a Gramática Portuguesas

Cristóvão de Aguiar

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